Gabriel Tupinambá: a verdadeira e nova psicanálise no Brasil

Se as gerações anteriores se debateram sobre problemas infinitamente menos importantes que as reflexões aqui levantadas sobre a política e o desejo, resta-nos constatar que nossos esforços para pensar algo além de nosso próprio tempo e de inspirar gerações lacanianas futuras não foram de todo fracassados. Depois deste livro, podemos morrer em paz.

Pequena ­flor Urano (2024), de Darks Miranda. Foto: Julia Th­ompson.

Por Christian Dunker

O desejo de psicanálise, de Gabriel Tupinambá, é a melhor crítica até agora realizada da ideologia lacaniana. Em tempos de elogios fáceis e autorreferidos, é difícil dar a essa afirmação seu devido peso. Ainda que comece e se concentre em objeções milimétricas ao millerianismo, seu texto serve para qualquer derivação ou assimilação do pensamento lacaniano – e isso só poderia ser feito por alguém com pleno domínio de áreas tão díspares quanto a formalização lógica, as políticas marxistas revolucionárias e a viva experiência de instituições e movimentos sociais “tais como eles são”.

A variedade de métodos, a extensão dos testemunhos e o rigor das leituras que se encontram neste texto formam algo incomum. Seu objetivo, no entanto, é comum e de grande impacto: pensar uma psicanálise no Brasil e para o Brasil em contexto global. Psicanálise em tempo e espaço reais, com seus impasses formativos cotidianos, com sua dificuldade de expandir os limites de seu conceito de formação e com suas evitações em relação a dinheiro, autoridade e poder.

Eis um exemplo de que se produz verdadeira e nova psicanálise no Brasil. Se as gerações anteriores se debateram sobre problemas infinitamente menos importantes que as reflexões aqui levantadas sobre a política e o desejo, resta-nos constatar que nossos esforços para pensar algo além de nosso próprio tempo e de inspirar gerações lacanianas futuras não foram de todo fracassados. Depois deste livro, podemos morrer em paz.


Extremamente original, O desejo de psicanálise contribui para a superação dos limites atuais da psicanálise lacaniana, além de propor uma prática psicanalítica que se pretenda pública. Mais que uma aplicação da vertente lacaniana à política, trata-se de uma leitura marxista, com suporte da filosofia e das ciências, que reavalia os impasses e os méritos da clínica e teoria de Lacan. Já reconhecida internacionalmente, a obra foi primeiro publicada em língua inglesa. Agora chega ao país natal do autor com lançamentos também em russo e espanhol.

O desejo de psicanálise, de Gabriel Tupinambá, tem tradução de Gabriel Lisboa Ponciano, apresentação de Carla Rodrigues, prefácio de Slavoj Žižek, texto de orelha do Coletivo Margem Psicanálise, texto de quarta capa de Christian Dunker e capa de Livia Viganó sobre Pequena ­flor Urano (2024), de Darks Miranda (foto de Julia Th­ompson).



No dia 29/10 às 19h30, não perca a live de lançamento do livro Christian Dunker, Carla Rodrigues, Carol Leão e Gabriel Tupinambá, mediação de Maikel Silveira, na TV Boitempo:

***
Christian Dunker é psicanalista e professor titular do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP), obteve o título de livre-docente em psicologia clínica após realizar pós-doutorado na Manchester Metropolitan University (2003). Atualmente é analista membro de Escola do Fórum do Campo Lacaniano. Tem experiência na área clínica com ênfase em psicanálise, atuando principalmente com estrutura e epistemologia da prática clínica, teoria da constituição do sujeito, metapsicologia, filosofia da psicanálise e ciências da linguagem. Coordena, ao lado de Vladimir Safatle e Nelson da Silva Jr., o Laboratório de Teoria Social, Filosofia e Psicanálise (Latesfip-USP). Autor de várias obras, pela Boitempo publicou Mal-estar, sofrimento e sintoma: uma psicopatologia do Brasil entre muros (2015), livro ganhador do prêmio Jabuti em 2016 na categoria psicologia, psicanálise e comportamento, e Lacan e a democracia: clínica e crítica em tempos sombrios (2022).






1 Trackback / Pingback

  1. 6 livros para repensar a relação entre psicanálise e política – Blog da Boitempo

Deixe um comentário