Cultura inútil | Com Trump, o imperialismo ganha força ou estrebucha para se manter? 

Trump e Bolsonaro em junho de 2019. Foto: Alan Santos / PR via WikiCommons.

Por Mouzar Benedito

Eu costumava falar sobre três “legados” estadunidenses para a Humanidade, totalmente dispensáveis: a bomba atômica, a Coca-Cola e o neoimperialismo, sendo a bomba e a beberagem usadas a serviço do imperialismo. 

Bom, vamos ao começo dessa coisa chamada imperialismo, o colonialismo, a ocupação de territórios e o domínio de uma nação sobre outras, sugando tudo o que podia e “justificando” como sendo uma nação superior ou cultura superior. Essa “superioridade” se manifestava mesmo era pelas armas, exércitos poderosos. Aí vieram as nuances, o imperialismo, mantendo às vezes o poderio sobre outras nações pelas armas, mas podendo nem precisar disso: empresas transnacionais se encarregavam (e se encarregam) da acumulação de capital em conexão com seus respectivos Estados. Sim, quando necessário, o poderio militar era e é utilizado para dar cobertura e força a essas empresas. Os Estados Unidos aprimoraram isso, espalhando seus tentáculos em forma de empresas, produtos e cultura pelo mundo todo — e quando havia e há obstáculos, não vacilam em utilizar a guerra como meio de dominação.  

Voltemos às três “contribuições” da gringolândia para o mundo. 

A bomba atômica não foi mais usada desde a Segunda Guerra, mas continua sendo desculpa para guerras, nas quais o imperialismo se manifesta com frequência. Um “clube” de possuidores da bomba não admite que outros países as tenham também. Criaram um “Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares”, que não passa de uma afirmação do imperialismo. Os países que têm a bomba, principalmente os Estados Unidos e seu aliado incondicional, Israel, comportam-se de uma maneira que me lembra uma briga de vizinhos em que um tem revólveres e fuzis e não admite que o outro também tenha. É assim: se tivermos uma briga (que eu mesmo vivo provocando), resultando num duelo, vou de revólver e fuzil, e você vai de estilingue. Ah, chamei Israel de aliado incondicional, mas cada vez mais me convenço que os todo-poderosos Estados Unidos são vassalos de Israel. Israel manda, os Estados Unidos obedecem.

A Coca-Cola venceu. A gringolândia a espalhou pelo mundo inteiro, ou quase. O que os italianos chamavam de “água negra do imperialismo” é agora uma beberagem inevitável que arrumou um aliado, o McDonald’s. 

O neoimperialismo, ou simplesmente imperialismo “aperfeiçoado” pela gringolândia, de um tempo pra cá ficou meio esquecido no discurso, mas atuante e vivo na prática. Até mais: hoje tudo depende de mídias sociais, satélites… desde negócios internacionais e o funcionamento de governos até meras transações bancárias, tudo depende de tecnologias e aparelhagens dominadas por quem? Se quiserem, “desligam” tudo e nada funciona onde não quiserem. Nem sacar dinheiro num banco ou pagar uma compra com cartão de crédito ou débito, ou pix, será possível. Caos total!  

E não duvide que aprontem isso. Pode acontecer. Qualquer tentativa de substituir o dólar nas negociações internacionais, por exemplo, é tratada como ameaça ao Império e “merece” punição exemplar. E Trump veio para arregaçar. Ao mesmo tempo em que transforma a pretensamente mais importante democracia do mundo em república bananeira (tendo um defeito a mais: não produzir bananas) — com um fanático babaca mas poderoso caudilho na defesa dos interesses do capital e especialmente da extrema direita —, também estrebucha tentando reativar um pouco do que se perdeu do imperialismo, em sua forma mais pretensiosa e cruel. O Trumpistão tornou-se uma ameaça ao mundo. E com um agravante: está cheio de imbecis no mundo se autoproclamando nacionalistas e patriotas, mas totalmente dispostos a bater continência para a bandeira do Império e submeter-se alegremente às suas ordens (aliás, já falei sobre eles por aqui).

Foi a atuação do agente laranja do imperialismo, vulgo Trump, que me inspirou a colher frases sobre este tema… Vamos a elas.   


Paul M. Sweezy (economista marxista estadunidense): “Toda nação capitalista traz em si, no período do imperialismo, as sementes do fascismo. Surge naturalmente o problema de saber se essas sementes devem deitar raízes e crescer”. 

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Eduardo Galeano: “Hoje as torturas são chamadas de ‘procedimento ilegal’, a traição se chama ‘realismo’, o oportunismo se chama ‘pragmatismo’, o imperialismo se chama ‘globalização’ e as vítimas do imperialismo se chamam ‘países em desenvolvimento’. O dicionário também foi assassinado pela organização criminosa do mundo. As palavras já não dizem o que dizem ou não sabemos o que dizem”.  

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Frantz Fanon: “O imperialismo deixa para trás germes de podridão que devemos detectar e remover clinicamente da nossa terra, mas também das nossas mentes” 

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Fanon, de novo: “Os oprimidos sempre acreditarão no pior sobre si mesmos”. 

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Thomas Sankara (ex-presidente de Burkina Faso): “O imperialismo é um sistema de exploração que ocorre não só na forma brutal daqueles que vêm com armas para conquistar território. O imperialismo frequentemente ocorre em formas mais sutis, um empréstimo, ajuda alimentar, chantagem. Estamos lutando contra esse sistema que permite que um punhado de homens na Terra governem toda a humanidade”. 

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Thomas Sankara, de novo: “Quando o povo se levanta, o imperialismo treme”. 

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Lula: “As pessoas nunca percebem que o imperialismo americano só teve influência nefasta em alguns países porque a sua elite era nefasta”. 

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Mao Tsé-tung: “Para fazermos a revolução necessitamos de um partido revolucionário. Sem um partido fundado na teoria revolucionária marxista-leninista, é impossível dirigir a classe operária e as grandes massas do povo à vitória sobre o imperialismo e seus lacaios”.  

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Mao, de novo: “O imperialismo é um tigre de papel”. 

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Mao, mais uma vez: “…são nossos inimigos todos aqueles que estão confabulados com o imperialismo: os caudilhos militares, os burocratas, a burguesia compradora, a classe dos grandes latifundiários e o setor reacionário da intelectualidade subordina a todos eles”.  

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Zack de la Rocha (rapper estadunidense): “Terras roubadas do México são iguais a cinco estados… imperialismo importa”. 

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Paco Ignacio Taibo II (jornalista mexicano nascido na Espanha): “O imperialismo sabe ou não sabe o que a União Soviética é capaz de fazer para nos defender? (…) Se errarem, destruirão o imperialismo até suas raízes, mas de nós também sobrará muito pouco; por isso temos que lutar pela paz com convicção”. 

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Che Guevara (em discurso às Nações Unidas): “Gostaríamos de ver esta Assembleia sair da complacência e seguir em frente. Gostaríamos que os comitês iniciassem seu trabalho e não que o parassem no primeiro confronto. O imperialismo deseja converter este encontro em um torneio oratório inútil, em vez de resolver os graves problemas do mundo. Nós devemos impedir que eles façam isso”. 

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Che, de novo: “Não se pode confiar no imperialismo nem um tantinho assim, nada”. 

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Che, mais uma vez: “Todas as nossas ações são um grito de guerra contra o imperialismo e um chamado vibrante à unidade dos povos contra o grande inimigo da humanidade: os Estados Unidos”. 

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Sukarno (ex-presidente da Indonésia, derrubado pelos gringos e britânicos usando um general marionete, Suharto, promovendo a matança de mais de um milhão de pessoas): “Devemos todos constituir a unidade nacional, unir todas as forças revolucionárias em uma onda poderosa para varrer nosso principal inimigo, o imperialismo político e o imperialismo econômico”.

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Sukarno, de novo: “Sempre parto do princípio de que é o imperialismo que precisa de nós, não nós que precisamos do imperialismo”.

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Pietro Ubaldi (filósofo italiano): “Cada religião se apoia no proselitismo, que corresponde ao imperialismo no campo político, o valor prático de cada grupo vindo do seu poder de conquista e domínio”. 

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Euclides da Cunha: “Expansão imperialista – Não é do direito, nem da Moral com as mais imponentes maiúsculas, nem de alguma das maravilhas metafísicas de outrora que lhes despontam obstáculos”. 

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Edward W. Said: “Estamos em um ponto do nosso trabalho em que não podemos mais ignorar os impérios e o contexto imperial em nossos estudos”. 

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Não sei quem: “Usado como broche pela rainha Vitória, o Kohinoor, um dos maiores diamantes do mundo, foi um dos muitos saques do imperialismo britânico”. 

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Fara Dabhoiwala (historiador e pesquisador da Universidade de Princeton): “Na ética do imperialismo, o julgamento final é sempre adiado para o futuro”. 

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Andrew Higgins (estadunidense fabricante de barcos durante a Segunda Guerra): “O imperialismo dos EUA é o inimigo mais feroz dos povos do mundo inteiro”. 

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Simone de Beauvoir: “Escravidão: esse fenômeno é consequência do imperialismo da consciência humana que procura realizar objetivamente sua soberania”. 

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Fernando Pessoa: “O imperialismo dos gramáticos dura mais e vai mais fundo que o dos generais”. 

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Fernando Pessoa, de novo: “Todo império é uma decadência. Uma sociedade forte que, principiando a decair, perca o sentido das realidades, o sentido prático, cai forçosamente no imperialismo”. 

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Lênin: “O imperialismo surgiu como desenvolvimento e continuação direta das propriedades fundamentais do capitalismo”. 

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Lênin, de novo: “Se fosse necessário dar a definição mais breve possível de imperialismo, diríamos que o imperialismo é a fase monopolista do capitalismo”. 

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Fidel Castro: “Com o imperialismo não queremos paz de nenhuma espécie! Enquanto houver imperialismo, e enquanto houver povos vítimas da agressão imperialista, e enquanto houver povos lutando contra o imperialismo, sua causa será nossa causa em qualquer rincão do mundo”. 

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Winston Churchill: “Não deixem que a Argentina se torne potência. Arrastará com ela toda a América Latina”. 

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Irving Babbit (crítico literário estadunidense): “A democracia agora está diante de uma cruzada contra o imperialismo”.

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Rosa Luxemburgo: “A tendência do capitalismo a expansões busca constituir o elemento mais importante, a característica mais notável da evolução moderna. Na verdade, a expansão acompanha a carreira histórica do capital; em sua fase final, o imperialismo assumiu uma energia tão impetuosa que põe em questão toda a existência civilizada da humanidade”. 

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Hugo Hamilton (escritor irlandês): “As regras da liberdade são mais difíceis de quebrar do que os ditames do totalitarismo e do imperialismo”. 

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Yves Theriault (escritor canadense): “Um canadense de verdade dever ser bilíngue se for franco-canadense e imperialista se for inglês”. 

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Salman Rushdie: “A sociedade britânica nunca foi purificada da imundície do imperialismo”.  

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Modibo Keïta (ex-presidente do Mali): “Devemos renunciar às nossas reivindicações territoriais se não quisermos estabelecer na África o que poderíamos chamar de imperialismo negro”. 

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Ray Bradbury (escritor estadunidense): “É também e sobretudo uma questão de imperialismo midiático, a grande lavagem cerebral feita pela publicidade, pelos jogos, pelas novelas e pelo ‘noticiário’ televisivo”. 

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Hassan Nasrallah (clérigo libanês): “Enquanto houver imperialismo no mundo, uma paz permanente é impossível”.

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Vilayanur S. Ramacachandran (neurocientista indiano): “Lembre-se que a política, o colonialismo, o imperialismo e a guerra também se originam no cérebro humano”.

*** Kim Il-sung (ex-presidente da Coreia do Norte): “O mais importante em nossos preparativos de guerra é ensinar todo o nosso povo a odiar o imperialismo americano. Caso contrário não seremos capazes de derrotar os imperialistas americanos que se gabam de sua superioridade tecnológica”. 

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Kim Il-sung, de novo: “É errado tentar evitar a luta contra o imperialismo sob o pretexto de que a independência e a revolução são importantes mas a paz é ainda mais preciosa”. 

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Noam Chomsky: “O imperialismo americano é frequentemente atribuído à conquista de Cuba, Porto Rico e Havaí em 1898”. 

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Karl Liebknecht (socialista alemão): “Como um ciclone, o imperialismo se espalha pelo globo; o militarismo esmaga os povos e suga seu sangue como um vampiro”. 

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Angela Davis: “Como mulher negra, minha política e filiação política estão ligadas e decorrem da participação na luta do meu povo pela libertação e da luta dos povos oprimidos em todo o mundo contra o imperialismo americano”. 

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Nikita Krushchev: “Quando se trata de combater o imperialismo, somos todos stalinistas”.  

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Ho Chi-Minh: “O colonialismo é uma sanguessuga de duas bocas: uma cravada no proletariado da metrópole, outra no proletariado das colônias. Se quisermos matar esse monstro, precisamos romper as duas pontas ao mesmo tempo”. 

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Mario Vargas Llosa: “Não há barbárie comparável à do colonialismo. A África nunca se recuperou”. 

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Eva Perón: “Na vida argentina já não há lugar para o colonialismo econômico, para a injustiça social, nem para traficantes da nossa soberania e do nosso futuro”. 

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Karl Marx: “O povo que subjuga outro forja suas próprias cadeias”.


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Mouzar Benedito, jornalista, nasceu em Nova Resende (MG) em 1946, o quinto entre dez filhos de um barbeiro. Trabalhou em vários jornais alternativos (Versus, Pasquim, Em Tempo, Movimento, Jornal dos Bairros – MG, Brasil Mulher). Estudou Geografia na USP e Jornalismo na Cásper Líbero, em São Paulo. É autor de muitos livros, dentre os quais, publicados pela Boitempo, Ousar Lutar (2000), em coautoria com José Roberto Rezende, Pequena enciclopédia sanitária (1996), Meneghetti – O gato dos telhados (2010, Coleção Pauliceia) e Chegou a tua vez, moleque! (2021, Editora Limiar). Colabora com o Blog da Boitempo mensalmente.

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